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Desempregada há um ano, a publicitária e designer gráfica Sibele Monice, de 57 anos, vive o que muitos brasileiros enfrentam nesta faixa etária: a dificuldade de encontrar emprego.
Desde a sua demissão, em fevereiro do ano passado, ela conta que conseguir vagas de trabalho com carteira assinada está cada vez mais raro.
Além do alto salário que ganhava em sua última empresa, a publicitária atribui a dificuldade de uma recolocação ao etarismo (preconceito contra a idade) por parte das organizações.
"Sinto que há esse preconceito e o etarismo tanto no mercado de trabalho quanto nas redes sociais. As pessoas acreditam que quem tem 50+ parou no tempo, mas isso não é verdade", diz.
Ela ressalta que nunca parou de se atualizar e aprender. "É um certo ceticismo quanto a nossa capacidade de acompanhar ou desenvolver", opina.
A profissional já chegou a ouvir que era muito qualificada para vaga, que seu currículo impressionava, mas que não podiam pagar o que ela valia.
De fato, a dificuldade para o público a partir de certa faixa etária encontrar um trabalho é uma realidade no Brasil.
Uma pesquisa realizada no meio do ano passado, pelas companhias Robert Half e Labora, que atuam na área de recrutamento e inovação, mostra que cerca de 70% das empresas contrataram muito pouco ou nenhum profissional com mais de 50 anos. Na prática, isso representa 5% das novas contratações.
Feito com mais 258 empresas, o estudo aponta ainda que cerca de 80% dessas organizações ainda não "estabeleceram métricas para avaliar o sucesso de suas iniciativas de inclusão da diversidade geracional".
O desemprego nessa idade chama ainda mais atenção, segundo os últimos números divulgados pela empresa IDados, consultoria especializada em análise de dados e soluções para aumentar o impacto e produtividade de empresas, organizações públicas e do terceiro setor.
De acordo com a entidade, em 2012, o número de desempregados acima de 50 anos era de 508,9 mil pessoas. Atualmente, eles já são aproximadamente 1,4 milhão de pessoas em busca de oportunidade de trabalho.
Com a inversão da pirâmide etária no Brasil e prolongamento da expectativa de vida da população, é cada vez mais comum ver pessoas mais velhas trabalhando.
E se antes havia a ideia de que o país era formado por maioria jovem, esse cenário mudou, reforça Maria José Tonelli, professora no departamento de Administração Geral e Recursos Humanos na FGV-EAESP.
"As empresas não se dão conta que a população brasileira está envelhecendo, embora os dados sejam evidentes", diz a especialista.
Essa transição também foi percebida em relação à aposentadoria, tanto no Brasil quanto no exterior. "Nós tínhamos socialmente um modelo de que as pessoas chegavam nos 50 e 60 e tinham que se aposentar, mas isso não é mais factível", destaca Tonelli.
Sibele concorda e ressalta que, mesmo tendo quase 60 anos, ainda precisa trabalhar e não pensa em se aposentar por enquanto. Com dificuldade em arranjar alguma vaga CLT — o regime celetista —, ela segue trabalhando como freelancer.
No entanto, até para vagas temporárias, a designer afirma que encontra uma certa resistência de quem contrata, mesmo que seja de forma velada.
"A gente passa uma vida se desenvolvendo para encontrar pessoas que nos julgam incapazes ou inferiores, por conta da idade. É triste e desafiador ao mesmo tempo", diz.
A aposentada Maria Aparecida de Oliveira tem 63 anos e afirma que está mais difícil encontrar trabalho na área financeira, posição que atuou por anos, até se aposentar pela iniciativa privada.
"Quero aumentar a minha renda e estou procurando trabalho há mais ou menos seis meses", diz.
Mesmo não sofrendo um preconceito direto pela idade, ela diz que, atualmente, só se depara com vagas de trabalho para atuar como atendente de telemarketing ou demonstradora de produtos de supermercado.
Segundo a professora da FGV, para que pessoas mais velhas voltem para o mercado de trabalho e ainda atuem na área de formação, é necessário desmistificar os estereótipos que essa população sofre. "É preciso vencer esse marcador social que é a idade", afirma.
Embora seja contra a lei colocar um limitador de idade em anúncios de contratações de trabalho, as empresas podem fazer isso de forma indireta.
Assim como a sociedade, muitas companhias podem reproduzir etarismo de forma inconsciente nos processos seletivos, segundo os especialistas.
Para mudar esse cenário, é necessário criar políticas eficientes, desde as primeiras etapas da entrevista.
"Quando olhamos para as empresas, temos que ter um olhar da prática empresarial. A empresa tem políticas concretas sobre esse assunto ou é algo que só fica no dia a dia", indaga Miriam Rodrigues , professora do Centro de Ciências Sociais e Aplicadas da Universidade Presbiteriana Mackenzie (UPM).
Eliminar um candidato simplesmente pela idade deve ser algo impensável e uma prática condenável nas organizações, segundo Rodrigues.
"Qualquer aspecto que seja discriminatório, a gente já coloca um carimbo. Competência não tem carimbo de validade", diz a professora do Mackenzie.
Outro aspecto que precisa ser levado em consideração na hora das contratações, é, de fato, a qualificação daquele profissional e não a idade.
Quando questionado se sabe mexer com tecnologia, por exemplo, qual o tipo de ferramenta o contratante quer que o candidato saiba para determinada função de trabalho.
"As tecnologias mudam com uma velocidade absurda. Pressupor que ele não está atualizado apenas pela idade dele é um preconceito imenso", diz.
Em alguns casos, a maneira mais fácil de avaliar uma pessoa para determinado cargo é por meio de testes práticos, que realmente permitam ao profissional demonstrar seu conhecimento.
A questão de gênero também é um forte indicativo quando falamos de desemprego entre pessoas acima dos 50 anos. No caso das mulheres, a dificuldade para uma recolocação se inicia até antes dessa idade.
"As mulheres começam a perceber o envelhecimento delas na força de trabalho aos 40 anos de idade", afirma Tonelli.
Há, ainda, uma cobrança excessiva em relação à aparência da mulher que, muitas vezes, não ocorre da mesma forma com os homens. Esse estigma social, segundo Tonelli, se reflete constantemente no mercado de trabalho.
"Se a mulher deixa o cabelo branco é vista como desleixada. Mas os homens que ficam com cabelo branco não são vistos com preconceito. Neles, isso significa experiência."
Ainda de acordo com o estudo da Robert Half e Labora, os profissionais desta faixa etária, que ainda atuam no mercado, são em sua maioria brancos e homens.
O levantamento também apontou que das 258 empresas que participaram da pesquisa, 36,47% afirmou que tem menos de 5% de mulheres 50+ no quadro de funcionários. Já 9% das empresas que responderam não tinham nenhuma mulher 50+.
De acordo com especialistas, esses efeitos são ainda mais intensos no caso de mulheres pretas, que também precisam lidar com questões misóginas e racistas.
"A hora que a gente pega todas as interseccionalidades, uma mulher preta 50+, tem mais desafios ainda para combater todos os ismos", destaca Andrea Tenuta, head de novos negócios da Maturi, empresa que atua na capacitação de pessoas com mais de 50 anos.
Ela ainda acrescenta que incentivar a educação e o letramento sobre o assunto não tem a ver só com o combate ao etarismo, mas, também, com as interseccionalidades.
A problemática se estende também à população LGBTQIAP+, que sofre com preconceitos diários e tem uma baixa expectativa de vida no Brasil.
"Os grupos de diversidade, os grupos sub-representados no mercado de trabalho, sofrem mais quando tem aí essa sobreposição dessas identidades", diz Tenuta.
Em dezembro do ano passado, a executiva de relacionamento com o cliente, Selma Dias, de 56 anos, conseguiu se recolocar em sua área.
Mas o processo foi bem difícil, segundo ela. Foram muitas entrevistas, currículos enviados, rede de networking acionada, mas demorou sete meses até conseguir voltar ao mercado de trabalho.
"Nunca me disseram diretamente sobre a idade, porém,os feedbacks indiretos eram muitos", diz.
Para Selma, o principal entrave durante o tempo em que ficou desempregada foi, justamente, conseguir uma entrevista.
Uma vez, durante uma entrevista de emprego, chegou a ser questionada por dois jovens se sabia o que era tecnologia. "Naquele momento, encerrei a entrevista.Só mostra o despreparo até para entrevistas de empregos de pessoas 50+", diz, indignada.
Mesmo tendo 25 anos de experiência em liderança no atendimento ao cliente e trabalhando em locais conceituados, encontrar empresas que eram abertas à diversidade, foi muito custoso.
Sempre que chegava ao final de um processo seletivo, com o gestor da vaga, Selma não era aprovada, e não recebia um retorno claro.
Na visão dela, a recusa ocorria pelo fato de que alguns líderes se sentiam ameaçados por ter uma pessoa mais experiente, e não levavam em consideração a ideia de ter um profissional que agregasse valor.
"Minha percepção, durante essa fase de transição, é que o preconceito ocorre mais pelos líderes requisitantes das vagas, do que pela área de RH", diz.
Hoje, trabalhando há quase três meses em uma nova companhia, ela conta que tem esperança de que o olhar para o profissional 50+ mude.
"Atualmente, estou trabalhando em uma empresa de serviços que se diferencia por realmente ser aberta à diversidade e por perceber que esse é um benefício inigualável para todos", ressalta.
Para aumentar a inserção desses profissionais no mercado de trabalho, é preciso pensar em ferramentas individuais, práticas organizacionais e na atuação do governo nesse processo.
"Estamos falando de sociedade. A população japonesa é envelhecida e o governo investiu na capacitação tecnológica dos mais velhos", destaca Tonelli.
Em relação às empresas, o ideal é avançar de modo geral na capacitação do profissional, dando um olhar diferenciado para aquele indivíduo mais velho.
Além disso, mudar a forma de como aquele candidato pode ser aproveitado para determinada função, é extremamente importante.
"Vamos precisar conviver com novas formas de trabalho e posições que privilegiam os diferenciais que a idade traz", diz Sérgio Serapião, co-fundador e CEO da Labora.
Ele explica que em setores de varejo, é muito difícil aproveitar uma pessoa 50+ em posições que a deixem muito tempo em pé. O ideal é que seja uma posição positiva para que possa extrair o melhor daquele candidato.
Para Serapião, é necessário ainda que as empresas mudem suas dinâmicas para conseguirem se tornar mais plurais. Pensar em mudanças significativas faz toda a diferença, segundo ele.
"O mais importante é o formato de trabalho. É fundamental pensar em jornadas curtas, que tenham um equilíbrio entre o trabalho e a saúde", afirma.
Por último, é preciso ter ações individuais. O profissional precisa estudar, buscar avanços e seguir na busca por emprego.
O ideal é fazer isso da maneira tradicional, e também procurar ajuda de empresas especializadas nesse tipo de recolocação de pessoas mais velhas.
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